O objetivo do blog é divulgar os dispositivos alternativos na rede de Saúde Mental e propagar a ideia da luta antimanicomial. A partir da democratização da psiquiatria, os profissionais de saúde mental visam trabalhar de forma interdisciplinar no âmbito do novo contexto da psiquiatria renovada.

sábado, 22 de maio de 2010

Desinstitucionalização e suas práticas práticas cotidianas. Parte 1

Ao longo dos séculos , os chamados "loucos" foram vistos de formas diferentes em cada sociedade. Na Modernidade, passou a predominar  a ideia de que essas pessoas em sofrimento psíquico deveriam ser afastadas do convívio social, pois representariam um risco à sociedade e a si mesmas. Essa mentalidade fez parte de um projeto higienista de segregação de tudo o que era estranho pelos padrões identificados como normais.

   Ao longo do tempo , este projeto ganha força científica e legitima a internação como método de assistência em saúde mental. Essa assistência vai mostrando seus resultados  e seu principal efeito colateral: o esquecimento  e o abandono dessa população. Assim, cada vez mais, os loucos são afastados do convívio social e a loucura encarcerada em grande s e sinistras instituições.


Nas últimas décadas, no entanto, muitos passaram a questionar essse modelo que construiu barreiras ao convívio social dos loucos - barreiras essas representadas pelos próprios muros dos hospitais psiquiátricos. Assim novas propostas foram surgindo.

 No Brasil, o movimento que propunha a extinção dos hospitais psiquiátricos ganhou contornos específicos em 1987, com criação do Movimento Nacional de Luta Antimanicomial(MNLA). O MNLA foi resultado da organização dos trabalhadores e Saúde Mental, que propunham a reformulação do modelo assistencial e reorganização dos serviços da área, privilegiando as equipes multiprofissionais, o atendimento fora do hospital e, principalmente, um outro lugar ao que nos parece estranho, para que esse não fosse mais higienizado e afastado dos olhos da sociedade.

  O MNLA foi um marco tão importante que até hoje, em 18 de maio, data da sua criação, é comemorado o Dia Nacional de Luta Antimanicomial. Esse movimento foi fundamental, por exemplo, para que o projeto da Reforma psiquiátrica fosse transformado em lei em 2001( lei 10216).

  Hoje , intensifica-se na luta antimanicomial um perspectiva que vai para além da desospitalização, propondo uma transformação na forma de a sociedade se relacionar com a loucura. Nesse sentido, é importante que os usuários de saúde mental possam ocupar a rua, envolver-se nas atividades da cidade, trabalhar, produzir cultura etc., oo que exige uma grande transformação no imaginário social e nas formas de relações sociais.

  A ideia é que esses sujeitos não sejam vistos a partir de sua doença, ou mesmo como doentes, mas como pessoas que amam, sofrem, sentem alegria , estudam, trabalham, divertem-se- enfim, vivem.Por outro lado, é preciso garantir políticas públicas que proporcionem a autonomia desses cidadãos, de forma que passem de objetos de um saber científico, ou seja, de doentes, a sujeitos de sua existência.

  É nessa diretriz que muitos psicólogos e outros trabalhadores da Saúde Mental  vêm atuando na área.  A Reforma psiquiátrica é uma proposta de, inicialmente, substituir os manicômios por outros serviços, a partir da percepção de que as instituições totais, além de abandonar sem nenhum cuidado os internos, trancafiando pessoas, privando do convívio social e violando os direitos humanos, pro~põem um modelo de cidade e sociedade em que é reservado apenas um sentido para a loucura, a doença mental. Sendo assim, a Reforma Psiquiátrica é também uma aposta ético- política que não serestringe a melhoria das condições de vida dos loucos  e ,sim, contrução cotidiana de outros sentidos para a loucura, desinstitucionalização de práticas de cuidado e desnaturalização de formas de morar, comer, conversar, viver.

  "Estamos  em um processo histórico ligado às lutas sociais, aos direitos humanos , e um coisa importante é avançarmos numa sociedade mais justa, mais igualitária, mais solidária. A estrutura e a história do manicômio  não servem, para  um processo de emancipação da sociedade como um todo, não possibilitam cura nem reabilitação, não contribuem para a promoção de saúde  e qualidade de vida", explica Patricia Dorneles, terapeuta ocupacional da UFRJ.

  Para a psicóloga Neli Maria Castro de Almeida, do Innstituto Franco Baságlia, a manutenção do modelo hospitalocêntrico no Brasil ocasionou um quadro de cuidado precário. " A continuidade  prolongada da forma de cuidar desconectada da possibilidade de cidadania mais ampla acabou  construindo um isolamento muito pesado para um segmento importante da população em situação de sofrimento psíquico. Daí a importância de pensar estratégias capazes de superar esses modelos".

Outro ponto importante é que os manicômios representam um modelo de tutela em que as pessoas em sofrimento psíquico são colocadas como incapazes. "Em Saúde Mental, trabalhamos com fatos e metas. Buscamos a construção de autonomia paranossos clientes. Essa autonomia se divide, como uma luz  que passa  em um prisma, em duas: a autonomia social é a que possibilita a alguém circular pela cidade e se colocar culturalmente. A autonomia diante da dor é aquela  que o habilita  a criar mecanismos de defesa perante as crises, aprender a se conduzir, descobrir seus limites, descobrir seus limites  e pedir ajuda. As internações sucessivas acabam por destruir essa expressão de liberdade. Esse é o fato, a meta é não internar", declara o médico e artista Lula Wanderley, diretor do Espaço aberto ao Tempo.     

Fonte: Jonal do CRP/RJ.
                     

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